Lembra? Aquele dia em que tentei puxar conversa com você,
que me olhou de olhar atravessado, rasgado como a noite, e me perguntou com
rispidez no olhar “O que é?”, e engoliu um seco que lhe raspou a garganta, e
como um gato maldito, arranhou sua traquéia, e sem nuance ou discórdia,
virou-se para a tela do computador, e colou seus pensamentos em ondas
virtuais...
Lembra? Aquele dia eu imaginei o Sol, e a praia, e as tardes
sorrateiras no verão da juventude, e me lembrei de como era bom sentir o salgado
do mar na pele nua, o arrepio que a gente sente quando a espuma gelada do mar
encosta na derme e eriça o corpo...
Aquele dia eu senti a lua lá fora enluarando as bromélias do
jardim, e imaginei borboletas e beija-flores por sobrevoar sobre elas, e provando
seu néctar, e sentindo seu cheiro, e fluindo sua energia vital, como os
libertinos fazem... Neste dia eu invejei a liberdade que eles desfrutam, e o
desprendimento da vida ociosa, e murcha, e parasitária que eles tem...
Então eu me transmutei para uma paisagem mais bonita e
desejável, um quadro mais belo, com nuances, e cores, e vida mais viva, com
imagens mais definidas e tecnologia de cores e tintas emolduradas em um papel
mental a qual somente eu poderia desfrutar...
Lembra? Pois este quadro tornou-se realidade. Eu, como
pintora da vida, me transmutei de corpo e alma para esta paisagem afrodisíaca,
e não tenho a menor pretensão de abandona-la. Mudar-me daqui nem pensar... E
voltar ao mundo acinzentado e de tons pastéis, com gelo e concreto ao qual você
me proporcionava, no silencio e sem odor, ao timbre de batidas de teclado e
vozes no silencio, não dá mais...
Estou de malas prontas, e com passagem só de ida.
Regozijo-me na vida, e aqui estou feliz! Daqui eu não quero
sair nunca mais!
Adeus!
Um comentário:
Simplesmente maravilhoso, lindo e tocante!
Suas palavras são como acordes, tocaram uma melodia reconfortante, passou das bordas da vida, para viver dentro dela! Amei...
Parabéns!
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